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quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

809 - Guerrilha urbana

Celina Côrte Pinheiro
médica ortopedista e traumatologista
celinacps@yahoo.com
É simplório considerar que os itens de segurança devam ser desprezados para que não ocorra a redução de adeptos
Há cerca de duas décadas, o uso das bicicletas passou a ser revigorado nas cidades brasileiras como mais uma possibilidade de exercício. A princípio, grupos organizados circulavam em horários de menor movimento nas ruas e rodovias. Mais recente é o estímulo à prática do ciclismo com vista não apenas ao lazer, mas também à melhoria da mobilidade urbana com preservação ambiental.
Na cidade de Fortaleza, também incluída neste processo de deslocamento com redução de poluentes, construíram-se as ciclofaixas e ciclovias, algumas improvisadas em ruas já estreitas para o tráfego habitual. Distribuídas em vários pontos da Cidade, buscam proteger os adeptos do esporte; contudo, por si só não bastam. Educar é preciso, embora bem mais difícil do que se adequar às tendências da modernidade.
Motoristas e motociclistas devem ter em mente a vulnerabilidade dos ciclistas, respeitando as ciclofaixas e trafegando com menor velocidade, fator inegável na redução de riscos. Por sua vez, os ciclistas devem se acercar de medidas protetivas pessoais. Capacetes, tênis, luzes, campainhas, espelhos retrovisores, luvas e coletes reflexivos são equipamentos mínimos para proteção dos ciclistas e visualização dos mesmos por terceiros. Há atropelamentos decorrentes da quase invisibilidade do ciclista, sobretudo em ruas mal iluminadas.
É simplório demais considerar que os itens de segurança devam ser desprezados para que não ocorra a redução do número de adeptos do ciclismo. A segurança e a educação devem estar atreladas à nova tendência, visando à redução do número de atropelamentos, com ou sem óbito. Quando há vítimas, a repercussão pessoal, social e financeira é bem maior do que se pode aquilatar.
Caso não ocorra conscientização dos riscos, respeito à vida e mudança de comportamento de todos os envolvidos nesta guerrilha urbana em que não há vencedores, a violência no trânsito tenderá a um incontrolável crescimento. O temor aos acidentes, este, sim, reduzirá o número de praticantes do ciclismo. Medidas adequadas e urgentes devem ser tomadas para coibir o aumento do número de vítimas do trânsito e reduzir a gravidade dos acidentes. A violência no trânsito já se constitui um sério problema de saúde pública e devemos nos esforçar para não torná-la ainda mais grave por omissão em um trânsito caótico, desrespeitoso e agressivo. E os pedestres, como ficarão nesta insana disputa por espaço e poder?
Artigo publicado no jornal O Povo (Opinião), em 15/12/2015 
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domingo, 8 de novembro de 2015

796 - Ciclistas também atropelam!

Celina Côrte Pinheiro, médica traumatologista e ortopedista
Presidente da Sobrames - Regional Ceará
Como pedestre, sinto agudamente a rudeza do trânsito nesta cidade, face à fragilidade inerente ao meu corpo e o visível descompromisso de muitos com minha comodidade e segurança. Não se trata de um discurso egocêntrico. Ao perceber a dificuldade e os riscos a que me encontro sujeita no enfrentamento às barreiras existentes na Cidade, sensibilizo-me com a problemática de toda coletividade.
Em Fortaleza, tem-se incentivado o uso das bicicletas com programas de compartilhamento, construção de ciclovias e ciclofaixas. Um sinal de civilidade, voltado ao lazer e à melhoria da mobilidade urbana! Contudo, os aparatos nem sempre correspondem ao ideal, por terem sido criados em vias já bastante comprometidas com o tráfego. Estreitas, inclinadas, com imperfeições na pavimentação e, por vezes, ocupadas por motociclistas apressados que as invadem para se deslocarem mais facilmente.
Não bastando isso, em algumas ciclofaixas a circulação de bicicletas pode se dar nos dois sentidos, embora a via tenha mão única. Esta simpática alternativa intensifica o risco de acidentes para os ciclistas que surgem inesperadamente na contramão, em trajetos por vezes mal iluminados, diante dos carros que tentam atravessar os cruzamentos.
Para o pedestre, nem se fala!
Está sujeito agora a maior risco de atropelamento não apenas pelos motorizados, como também por ciclistas que se consideram os cidadãos eleitos e não obedecem às normas do trânsito.
Todos os veículos motorizados, parados no semáforo vermelho, antes da faixa de retenção, enquanto o ciclista ultrapassa o cruzamento como dono da rua. Várias vezes precisei interromper a travessia na faixa de pedestres para dar passagem ao irresponsável ciclista. Caso contrário, seria atropelada, correndo risco de morte.
Os ciclistas se sentem à vontade para se apropriarem das ruas e das calçadas. É útil lembrar que as normas de trânsito são para todos e que ciclistas também podem atropelar e matar pedestres. Na escala de vulnerabilidade, este é o mais frágil.
Não basta darmos aos cidadãos a impressão de que a Cidade se tornou mais humana com a presença dos ciclistas nas ruas. Há necessidade premente de educação continuada para a mobilidade segura, civilizada e respeitosa, além da punição para os infratores. Ninguém está isento!
Publicado originalmente em O POVO (Opinião), de 21/08/2015
Celina, 
Dentre todos  eles (motoristas, motoqueiros, ciclistas e pedestres), os pedestres são aqueles que, a meu ver, estão na base da "cadeia alimentar". 
PGCS

quinta-feira, 24 de julho de 2014

640 - Por que os médicos estavam tão preocupados com o "rosto da bicicleta"?

Houve um tempo em que o principal perigo associado a bicicleta não tinha nada a ver com ser atropelado por um carro.Em vez disso, alguns médicos do final do século 19 advertiam que - especialmente para as mulheres - usar a bicicleta poderia levar a supostas condições médicas.
Uma delas, o "rosto da bicicleta".
"O excesso de esforço, a posição vertical da roda e o esforço inconsciente para manter o equilíbrio tendem a produzir um fatigado e exausto 'rosto de bicicleta '", observou o Literary Digest, em 1895. Passando a descrever essa condição como: "um rosto normalmente corado, mas às vezes pálido, muitas vezes com os lábios mais ou menos definidos e o início de sombras escuras (olheiras) sob os olhos, e sempre com uma expressão de cansaço."
Em outra publicação, dizia-se que a condição "era caracterizada por uma mandíbula dura, apertada e abaulamento dos olhos".
É difícil encontrar a primeira menção a essa "condição". Em um artigo de 1897, no National Review, de Londres, o médico britânico A. Shadwell alegou ter sido o primeiro a empregar a expressão, alguns anos antes. Quando também advertiu sobre os perigos de andar de bicicleta, especialmente para as mulheres, descrevendo o ciclismo "como uma mania que tem sido praticada por pessoas impróprias para qualquer esforço".
Obviamente, o "rosto de bicicleta" não é uma coisa real. Isso traz à tona uma questão interessante.
Por que os médicos estavam tão preocupados com o "rosto da bicicleta"?
Em 1890, na Europa e nos EUA, as bicicletas eram vistas por muitos como um instrumento do feminismo. Com as roupas que permitiam a muitas mulheres se envolveram em atividades físicas, as bicicletas lhe davam um aumento da mobilidade.
Como o Munsey's Magazine publicou em 1896:
"Para os homens, a bicicleta no começo era apenas um brinquedo novo, uma outra máquina adicionado à longa lista de dispositivos que eles dominavam em seu trabalho e lazer. Para as mulheres, era um cavalo sobre o qual cavalgavam em um novo mundo."
Tudo isso provocou uma reação de muitos médicos (masculinos) e espectadores, que alegavam várias razões para dissuadir as mulheres de andar de bicicleta. Em geral, eles argumentavam que andar de bicicleta era uma atividade desgastante demais, inadequada para as mulheres, e que - não só levaria ao rosto da bicicleta, como também causaria exaustão, insônia, palpitações cardíacas, dores de cabeça e depressão.
No final da década de 1890, no entanto, muitos médicos começaram a questionar publicamente a idéia do "rosto da bicicleta", observando que as pessoas poderiam se concentrar em andar ou dirigir qualquer tipo de veículo sem causar dano duradouro facial.
Em 1897, o Phrenological Journal, citando a médica Sarah Stevenson Hackett, de Chicago, encerrou a questão:
"[O ciclismo] não é prejudicial a qualquer parte da anatomia humana, uma vez que melhora a saúde geral. Eu tenho conscientemente recomendando o ciclismo, nos últimos cinco anos", disse ela. "A expressão facial de ansiedade e dor é vista apenas entre os iniciantes, e é devido à insegurança dos amadores. Assim que um ciclista se torna eficiente, ele pode dosar a sua força muscular e adquirir uma perfeita confiança em sua capacidade de equilibrar-se e em seu poder de locomoção, esta expressão deixa de existir" 
The 19th-century health scare that told women to worry about "bicycle face" by Joseph Stromberg. In: Vox. Traduzido por PGCS.
N. do T.
Em Semiologia, a palavra facies expressa o aspecto geral do rosto do paciente, onde se espelham sinais sugestivos de determinadas doenças ou situações clínicas. Na tradução deste artigo, poderia ter usado a expressão alternativa "facies do ciclista".
Correspondência
[...] Quanto ao facies de bicicleta, penso que comigo se deu o contrário. Aprendi a andar de bicicleta, após os 20 anos. Eu fora impedida na infância, pois minha irmã oito anos mais velha caíra espetacularmente e a bicicleta foi retirada de minha casa para não mais voltar. Contudo, nunca aceitei o fato de não saber andar de bicicleta. Pois, já grandinha, comprei uma e fui aprender a usá-la em uma extenso corredor na lateral de minha casa. Aprendi e depois arrisquei passeios mais interessantes. Meu facies era de pura felicidade quando senti que dominava aquele potro aparentemente selvagem no início de meu aprendizado. Posso garantir, portanto, que os cientistas do passado estavam errados e talvez muito mais preocupados com a presença do selim entre as coxas das donzelas do que com o suposto quadro de depressão, ansiedade, dentes cerrados etc.
Celina, Presidente da Sobrames-CE

sábado, 17 de novembro de 2012

438 - CICLISMO. A discussão sobre os capacetes


Um denominador comum dos programas bem sucedidos de bicicleta ao redor do mundo - de Paris a Barcelona - é que quase ninguém usa um capacete, e não há pressão para que faça isso. Nos Estados Unidos, a noção de que os capacetes promovem a saúde e a segurança, evitando lesões nas cabeças dos ciclistas, é tido como muito próximo de uma verdade de Deus. Assim, ciclistas sem capacetes são considerados irresponsáveis como as pessoas que fumam. E as cidades estadunidenses em geral são agressivas na promoção dos capacetes.
Mas, muitos especialistas em saúde europeus vêm tendo uma visão diferente. Sim, há estudos que mostram que, se você cair de uma bicicleta em uma determinada velocidade e bater com a cabeça, um capacete pode reduzir o risco de lesão grave no crânio. Mas tais quedas de bicicletas são menos comuns do que se pensa em sistemas organizados de ciclismo urbano.
Por outro lado, muitos pesquisadores dizem que, se as pessoas são forçadas a usar capacetes, também são desencorajadas a andar de bicicleta. Isso significa mais obesidade, mais doenças cardíacas e mais diabetes. E, com menos menos ciclistas nas ruas, menos interesse em criar ou ampliar ciclovias.
As cidades mais seguras para bicicletas são lugares como Amsterdã e Copenhague, onde os ciclistas de meia-idade são em grande número e o uso dos capacetes é pequeno.
"Forçar a usar capacetes, especialmente em programas de compartilhamento de bicicletas, cria uma sensação de perigo injustificável para o ciclismo que traz tantos benefícios para a saúde", diz Piet de Jong, professor do departamento de Finanças Aplicadas e Estudos Atuariais da Universidade Macquarie, em Sydney. Ele estudou o assunto com modelagem matemática e concluiu que os benefícios podem superar os riscos por 20 a 1.
Ele acrescenta: "Estatisticamente, antes de usar capacetes para andar de bicicleta, talvez devêssemos usá-los para subir escadas ou tomar banho porque há muito mais lesões durante estas atividades." E a Federação Europeia de Ciclistas afirma que ciclistas e pedestres apresentam o mesmo risco de lesão grave por milha percorrida.
No entanto, nos Estados Unidos, a National Highway Traffic Safety Administration recomenda que "todos os ciclistas usem capacetes, não importa por onde estejam andando", como diz Dr. Jeffrey Michael, funcionário da referida agência.
A experiência recente sugere que, caso uma cidade queira que o compartilhamento de bicicletas realmente decole, ela tem  que aceitar o uso opcional do capacete. O programa de compartilhamento de bicicletas em Melbourne, na Austrália - onde o uso de capacete é obrigatório - tem apenas cerca de 150 utilizações por dia, apesar de Melbourne ser plana, com ruas largas, e ter clima temperado. Por outro lado, a cidade de Dublin - fria e montanhosa - tem mais de 5.000 passeios diários em seu programa. E a Cidade do México, para pôr em funcionamento o seu programa de compartilhamento de bicicletas, revogou recentemente a sua lei do capacete obrigatório. Nos Estados Unidos, há muita discussão a respeito de uma mudança na atual orientação.
Extraído do artigo To Encourage Biking, Cities Lose the Helmets, The New York Times