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domingo, 8 de novembro de 2015

796 - Ciclistas também atropelam!

Celina Côrte Pinheiro, médica traumatologista e ortopedista
Presidente da Sobrames - Regional Ceará
Como pedestre, sinto agudamente a rudeza do trânsito nesta cidade, face à fragilidade inerente ao meu corpo e o visível descompromisso de muitos com minha comodidade e segurança. Não se trata de um discurso egocêntrico. Ao perceber a dificuldade e os riscos a que me encontro sujeita no enfrentamento às barreiras existentes na Cidade, sensibilizo-me com a problemática de toda coletividade.
Em Fortaleza, tem-se incentivado o uso das bicicletas com programas de compartilhamento, construção de ciclovias e ciclofaixas. Um sinal de civilidade, voltado ao lazer e à melhoria da mobilidade urbana! Contudo, os aparatos nem sempre correspondem ao ideal, por terem sido criados em vias já bastante comprometidas com o tráfego. Estreitas, inclinadas, com imperfeições na pavimentação e, por vezes, ocupadas por motociclistas apressados que as invadem para se deslocarem mais facilmente.
Não bastando isso, em algumas ciclofaixas a circulação de bicicletas pode se dar nos dois sentidos, embora a via tenha mão única. Esta simpática alternativa intensifica o risco de acidentes para os ciclistas que surgem inesperadamente na contramão, em trajetos por vezes mal iluminados, diante dos carros que tentam atravessar os cruzamentos.
Para o pedestre, nem se fala!
Está sujeito agora a maior risco de atropelamento não apenas pelos motorizados, como também por ciclistas que se consideram os cidadãos eleitos e não obedecem às normas do trânsito.
Todos os veículos motorizados, parados no semáforo vermelho, antes da faixa de retenção, enquanto o ciclista ultrapassa o cruzamento como dono da rua. Várias vezes precisei interromper a travessia na faixa de pedestres para dar passagem ao irresponsável ciclista. Caso contrário, seria atropelada, correndo risco de morte.
Os ciclistas se sentem à vontade para se apropriarem das ruas e das calçadas. É útil lembrar que as normas de trânsito são para todos e que ciclistas também podem atropelar e matar pedestres. Na escala de vulnerabilidade, este é o mais frágil.
Não basta darmos aos cidadãos a impressão de que a Cidade se tornou mais humana com a presença dos ciclistas nas ruas. Há necessidade premente de educação continuada para a mobilidade segura, civilizada e respeitosa, além da punição para os infratores. Ninguém está isento!
Publicado originalmente em O POVO (Opinião), de 21/08/2015
Celina, 
Dentre todos  eles (motoristas, motoqueiros, ciclistas e pedestres), os pedestres são aqueles que, a meu ver, estão na base da "cadeia alimentar". 
PGCS

domingo, 25 de janeiro de 2015

702 - Homeopatia: natural ou sobrenatural?

Um dos remédios mais utilizados em homeopatia é o Oscillococcinum, que é prescrito para o tratamento da gripe. Feito a partir de fígado de pato e diluído em 10 ou 100 partes de água, repetidamente, até atingir o número de 200 diluições (200C).
Só que, por volta da décima segunda diluição (12C), já não existe uma única molécula do produto dissolvido na água. A Constante de Avogadro prova isso, o que Hannemann ao fundar a homeopatia não sabia.
Praticantes de homeopatia não negam esse desacordo com a química. A homeopatia foi desenvolvida antes dos conceitos de átomos e moléculas surgirem.
Mesmo assim, as diluições prosseguem por mais 188 vezes. Em 200C a proporção é de uma parte do extrato de fígado de pato para 100 seguido de 400 zeros partes de água.
Como não há mais o extrato que foi diluído, os homeopatas tentam justificar a ação do remédio pela "memória da água". A existência dessa suposta memória é algo que dura fetossegundos.
Se isso fosse o caso, toda a água do planeta seria um tratamento homeopático para todo mal, porque alguma vez ela tocou em toda erva, mineral ou fígado de animal da prateleira homeopática.
Ler também
Guía completa para desmontar las mentiras sobre la homeopatia, Per Ardua ad Astra
Una bacteria inexistente, un pato inocente y unas amenazas insensatas, Naukas
Como agarrar um milionário
O milionário não é o pobre do pato cujo fígado vai já virar extrato. É o dono dele que, após preparar um remédio homeopático, o  Oscillococcinum 200C, terá produto suficiente para tratar as pessoas gripadas em todo o mundo nos próximos milhões de anos.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

467 - Que é um bom médico?

por Cristiane Segatto,  ÉPOCA
Em seu primeiro dia como residente da Universidade Harvard, o cirurgião americano Martin Makary ouviu uma frase que o marcaria para sempre.
“Esse paciente é do Hodad”, disse um dos residentes.
O jovem Makary, encantado por receber treinamento num dos centros médicos mais respeitados do mundo, mal podia esperar o momento de avistar o astro e, se tudo corresse bem, ser aceito como discípulo.
Mais tarde, envergonhado, confessou ao colega que nunca tinha ouvido falar no cirurgião Hodad. O amigo respondeu:
“Dr. Westchester é Hodad. É assim que nós, os residentes, o chamamos. H-O-D-A-D significa Hands of Death and Destruction (mãos de morte e destruição)”.
O médico era um perigo ambulante. O excesso de autoconfiança o levava a cometer sucessivos erros cirúrgicos. Hodad se achava bom em tudo. Arriscava-se e colocava os doentes em risco ao realizar operações que não eram sua especialidade.
Os pacientes nem desconfiavam. Agradeciam pelo tratamento recebido e o recomendavam aos amigos. O jovem Makary não entendia como os pacientes podiam ter uma percepção tão equivocada de um cirurgião que, sob o julgamento técnico dos colegas, era ruim. Conseguiu entender quando passou a acompanhar o médico mais velho nas visitas aos pacientes. Hodad era simpático, divertido, caloroso, bom de conversa. Os pacientes o adoravam. Até quando uma complicação ocorria, o que não era raro, Hodad era capaz de arranjar uma desculpa. Os doentes iam para casa convencidos de que ele não errara e felizes por terem estado em boas mãos.
Do ponto de vista técnico, Hodad era uma fraude. Do ponto de vista de popularidade, era um espetáculo.
No mesmo hospital, trabalhava outro cirurgião. Um grandalhão, de cara amarrada e péssimos modos. Grosseiro, na maior parte das vezes. Sempre pronto a humilhar as enfermeiras e outros funcionários.
Os alunos o chamavam de Raptor. Tinham medo dele. Os pacientes também. Raptor acumulava queixas de maus modos no departamento de atendimento ao cliente. Muitos pediam para ser operados por Hodad, o picareta com fama de excelente médico.
Os observadores bem informados ficavam intrigados com a ironia da situação. Apesar de seu comportamento terrível, Raptor tinha qualidade técnica muito acima da média. A incrível precisão cirúrgica e a insistência de se aproximar da perfeição a cada procedimento fizeram dele o cirurgião de melhor reputação entre os colegas. Até os que odiavam seus modos eram capazes de reconhecer sua superioridade técnica. Ao longo da carreira, Makary viu chefes de Estado, celebridades, e outros poderosos caírem nas mãos de gente como Hodad, sem ter a menor ideia do risco que corriam. Viu também moradores de rua operados por brilhantes Raptors, sem desconfiar de que eles eram a elite da profissão.
Essa é uma história universal. Quase todo hospital tem um Hodad e um Raptor. E profissionais de todo tipo entre esses dois perfis extremos. No Brasil, é exatamente assim – sobretudo naqueles que são considerados os melhores hospitais.
Se até os poderosos estão sujeitos aos Hodads, como o cidadão comum pode saber se o profissional e o hospital escolhido é bom mesmo?
Podemos escolher hotéis e restaurantes a partir de critérios técnicos, mas somos impedidos de comparar as diferentes instituições de saúde a partir de parâmetros objetivos.
Qual é o índice de infecção do hospital A? E as taxas de complicação do B? Qual é a sobrevida de quem faz uma cirurgia cardíaca ou um transplante aqui ou ali? Esses dados existem. Pelo menos no grupo de 21 hospitais brasileiros que dispõem de um selo de qualidade emitido por uma entidade chamada Joint Commission International.
Por enquanto, porém, essas informações são guardadas a sete chaves. Ainda que um hospital divulgue um ou outro parâmetro (em geral, o que lhe é favorável), não podemos comparar as diferentes instituições.
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quarta-feira, 21 de março de 2012

358 - Colonterapia

Acta Pulmonale, em três notas anteriores (112 - Uma obsessão por enemas, 118 - A fumigação em seres humanos e 152 - Um monumento ao enema) já se referiu, ainda que de forma superficial, à preocupação das pessoas com o problema da constipação intestinal. É justificável que elas recorram a enemas para resolvê-lo?
Leia-se a opinião do renomado proctologista Dr. P. H. Saraiva Leão, no artigo Colonterapia, o qual foi publicado em 21/07/2010, no Jornal "O Povo":
(trecho final)
"Modernamente, à luz da ciência, reconhece-se a imprecisão dessas verdades nocionais (hipotéticas). Está comprovado que a “estase intestinal crônica” não traz autointoxicação. Normalmente, a maioria dos constipados crônicos, “enfezados”, precisa menos de lavagens do que – principalmente – de dieta apropriada, baseada em fibras (frutas e verduras), para o exercício satisfatório de suas funções alvíneas (ligadas à evacuação). E na inércia crônica total dos cólons, justifica-se a operação para sua retirada parcial.
Tais considerações me ocorrem a propósito de notícias do sudeste do país, onde lavagens intestinais estão sendo realizadas periodicamente (ao preço mínimo de R$ 120 por sessão) em consultórios biomédicos e SPAs. Indicam-nas como analgésico (inclusive dores reumáticas), enxaqueca, “raivas antigas”(!) e até, pasme o leitor, contra depressão. Sobre revalidar crenças há muito ultrapassadas, a aludida técnica, como todo procedimento invasivo, tem contraindicações e riscos próprios, como perda acentuada de minerais, assim afetando a musculatura, inclusive o músculo cardíaco; outro risco é a perfuração do intestino pelo excesso de líquido introduzido. Este perigo é maior nos portadores de divertículos, os quais – prevalentes entre a terceira e a quinta décadas – tornam-se frequentes nos mais idosos. Fica, assim, um aviso aos pacientes incautos, amantes dos modismos e “novidades”, ainda e sempre vigente entre os desavisados.
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Prezado Paulo,
Concordo com o colega Pedro Henrique na contra-indicação de tal procedimento.
Para constipação ou prisão de ventre, além do uso de novos medicamentos, a dieta, o tratamento comportamental e a fisiocinesioterapia, através da massoterapia abdominal com estímulo das zonas de hipersensibilidade de Vougler, são os novos horizontes para a melhora deste distúrbio funcional, que sempre é associado a outras disfunções do assoalho pélvico ou do próprio intestino.
Roberto Misici, médico coloproctologista