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quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

1237 - O método de Abraham Wald

Condutas baseadas em evidências, aviação militar e a importância de fazer as perguntas certas
Dr. Bernardo Schubsky *, Medscape
Como profissionais de saúde e estudantes, estamos constantemente nos deparando com novas situações e desafios, mas como podemos ter a certeza de estarmos mantendo vivo o nosso espírito inquisitivo? O caminho mais fácil logicamente é presumir que a informação que já temos seja exata. Ou simplesmente aceitar que o que está sendo dito pelos nossos professores e colegas é a melhor resposta.
Essa postura pode levar ao terrível viés de confirmação, por meio do qual repetimos um comportamento apenas por força do hábito, sem nunca voltar ao início da questão. Mas, claro, essa não é a melhor maneira de consolidar nossas memórias remotas – se formos estudantes – nem de assegurar um exercício profissional eficaz baseado em evidências – se formos médicos atuantes.
E então você provavelmente está se perguntando: O que a saúde tem a ver com aviação militar?
Aí vamos nós...
Durante a Segunda Guerra Mundial, o matemático Abraham Wald foi encarregado pela Real Força Aérea britânica (RAF, do inglês Real Air Force) de analisar a distribuição do padrão das marcas de tiros nos aviões que retornavam das zonas de combate e escolher as áreas mais atingidas para determinar o melhor posicionamento da blindagem. Como o avião precisava ser o mais leve possível, o objetivo era blindar somente as áreas mais atingidas, para aumentar as chances de sobrevivência dos pilotos.
Mas Abraham percebeu que a pergunta estava sendo feita de modo radicalmente equivocado, e aquilo que ele fora incumbido de analisar não estava correto. Para começar, os aviões nos quais ele estava investigando o padrão de distribuição das marcas de bala eram os que tinham voltado, não os que foram abatidos. Traçando um paralelo com a saúde, ele não foi solicitado a avaliar o grupo que precisava de tratamento, foi-lhe pedido para examinar o grupo que não precisava da intervenção. Hmmm, isso é intrigante...
A sua abordagem criativa para resolver o problema foi voltar ao início do problema: Por que a RAF solicitou a análise dos padrões das marcas de bala?
Abraham reformulou a pergunta objetivamente para: “Como a integridade do avião pode ser reforçada sem termos acesso aos aviões abatidos?"
A seguir ele analisou o padrão de “menos marcas versus ausência de marcas” e percebeu que a maioria das marcas se direcionava às partes estruturais dos aviões, como o tanque de combustível ou os componentes do motor.
O método de Abraham Wald voltou a ser usado nas guerras seguintes, tornando-se o método convencional de análise da integridade das aeronaves.
A lição é que devemos manter sempre viva uma faísca de questionamento, e não nos darmos por satisfeitos com a explicação mais imediata para cada nova questão que enfrentamos. Devemos permanecer ávidos para entender o porquê antes do como durante nossas aulas. E mesmo que os dados apresentados sejam as melhores informações disponíveis, ao mudar de atitude, trocando a nossa mentalidade do aprendizado passivo para o ativo, já teremos dado um enorme salto em termos de compreensão e consolidação dos nossos conhecimentos.
Ao retirar nosso cérebro da zona de conforto, nos permitimos fazer novas associações e armazenar as informações na nossa memória remota. E, futuramente, se nos confrontarmos com um ponto de vista oposto, será mais fácil recordar a informação anterior e compará-la com a nova, formulando novas questões e dando sequência ao ciclo virtuoso do aprendizado.
A sugestão prática aqui é sempre ir às aulas e às discussões clínicas preparando-se com um pouco de informação e muitas perguntas. Durante a aula, a maioria das perguntas será respondida naturalmente, solidificando nossas associações mentais. As questões que não foram abordadas são as que podem nos levar ao próximo nível e nos permitir avançar nos nossos estudos.
* O Dr. Bernardo Schubsky é formado em medicina, tem mestrado em educação médica e está fazendo doutorado na mesma área.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

456 - Sem Ciência não há futuro

Uma das definições mais simples e completas sobre a Ciência foi proferida por Manuel Lozano Leyva, professor de Física Atômica e Molecular da Universidade de Sevilha, em uma de suas palestras. Ele disse, em seu tom de humor habitual, que a Ciência é o que se faz quando se aplica o método científico. Apesar da aparente redundância e simplicidade da definição, esta frase de Leyva é mais acurada e explicativa se soubermos o que é e como funciona o método científico.
É um conceito fundamental que, muitas vezes, fica despercebido, esquecido ou simplesmente ignorado. Acredita-se, erroneamente, que a Ciência é o que dizem os cientistas ou é o que se publica em uma revista científica, sem considerar que, na realidade, estamos em um processo que se distancia da ideia dogmática, e que não permanece imutável uma vez iniciado, porém exposto a mudanças, acréscimos e correções.
Também é muito comum entender essas mudanças e correções como erros da ciência, quando, na verdade, eles são parte essencial dela. É comum ouvir ou ler comentários de que a Ciência estava errada, quando se pensava tal e qual coisa há alguns anos, sem realmente compreender que o ato de retificar é uma parte indispensável do caminho científico. Um caminho que busca compreender o mundo, através da construção sistemática de hipóteses mensuráveis ​​e verificáveis, a fim de que nos aproximemos cada vez mais do funcionamento da realidade. [...]
Poderia resumir que o método científico é uma ferramenta poderosa para descobrir como funciona o mundo, através de uma série de etapas, que começam com a observação, a experimentação e/ou a medição de um fenômeno natural. Após estes passos iniciais, o seguinte é a formulação de uma hipótese para explicar esse fenômeno. Se a explicação se ajusta aos dados e experimentos, o trabalho é publicado em revistas acreditadas, sendo submetido a um cuidadoso estudo e análise por outros cientistas. Essa comunicação é necessária para que se possa comprovar, por novas pessoas e outros métodos, que a hipótese é válida. Se isto acontecer, a hipótese passa a se tornar uma teoria.
Pensa-se, frequentemente, que uma teoria científica (talvez o nome teoria confunda a muitos) seja uma ideia ao acaso que não tem validade ou que está por demonstrar. Mas, em Ciência, uma teoria é na verdade uma hipótese confirmada e verificada. Existem teorias que já foram verificadas e confirmadas milhares e até milhões de vezes (a Teoria da Relatividade e a Teoria da Evolução são os exemplos mais conhecidos). Sem elas não entenderíamos o mundo de hoje. [...]

Extraído de 7 cosas que la Ciencia podría enseñar a los políticos. In: La Aldea Irreductible

Ilustração: veio daqui