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quinta-feira, 1 de maio de 2025

1411 - "Olhar à direita"

Oliver Sacks foi um neurologista que reivindicou para o saber médico uma nova abordagem descritiva, que aproxima os "relatos de casos" a técnicas romanescas, transformando estudos científicos em peças lierárias, com personagens e enredos tão imponderáveis quanto universais.
Um dos casos que ele relatou é o de uma mulher brilhante, na casa dos sessenta anos, chamada Sra. S., cujo hemisfério direito foi devastado por um derrame maciço. Embora isso a tenha deixado com "inteligência perfeitamente preservada — e humor", também a deixou vivendo em apenas metade do mundo.
Extraído do relato "Olhar à direita", in "O homem que confundiu sua mulher com o chapéu":
Às vezes, ela reclama com as enfermeiras que elas não colocaram sobremesa ou café em sua bandeja. Quando elas dizem: "Mas, Sra. S., está bem ali, à esquerda", ela parece não entender o que elas dizem e não olha para a esquerda. Se sua cabeça for gentilmente virada, de modo que a sobremesa fique visível, na metade direita preservada de seu campo visual, ela diz: "Ah, é isso — não estava lá antes". Ela perdeu totalmente a ideia de "esquerda", com relação ao mundo e ao seu próprio corpo. Às vezes, ela reclama que suas porções são muito pequenas, mas isso ocorre porque ela só come da metade direita do prato — não lhe ocorre que ele também tem uma metade esquerda. Às vezes, ela passa batom e maquia a metade direita do rosto, deixando a metade esquerda completamente negligenciada: é quase impossível tratar dessas coisas, porque sua atenção não pode ser atraída para elas e ela não tem concepção de que elas estão erradas. Ela sabe disso intelectualmente, e pode entender, e rir; mas é impossível para ela saber diretamente. Sabendo intelectualmente, sabendo por inferência, ela desenvolveu estratégias para lidar com sua impercepção. Ela não pode olhar para a esquerda diretamente, não pode virar à esquerda, portanto o que faz é virar para a direita — até completar um círculo. Por isso, ela pediu, e lhe foi dada, uma cadeira de rodas giratória. E agora, se ela não consegue encontrar alguma coisa que sabe que deveria estar ali, ela vai girando para a direita, formando um círculo, até que o que ela deseje fique à vista. A sra. S. descobriu que isso tem excelentes resultados quando não consegue encontrar o café ou a sobremesa. Pareceria muito mais simples para ela girar o prato em vez de a si mesma. Ela concorda, e já tentou fazer isso — ou pelo menos tentou fazer a tentativa. Mas é estranhamente difícil. [...]
Negligência unilateral
Pacientes com negligência unilateral se comportam não apenas como se nada estivesse realmente acontecendo em um de seus hemiespaços, mas também como se nada de importante pudesse ocorrer ali.

quinta-feira, 4 de junho de 2020

1152 - De médico a paciente, pela segunda vez!

O médico Daniel Takana, de Parintins-AM, já havia pegado o coronavírus, se curou, voltou para a linha de frente, mas se contaminou outra vez 
"Já supostamente imune ao vírus, após cumprido meu período de isolamento, voltei ao combate na linha de frente.
Confiante, fui fazer meu exame a fim de obter a detecção do IgG, que mostraria que meu organisno estaria recuperado.
Minha decepção ao saber que ainda tinha apenas o IgM positivo.
Ok. Vamos em frente. Não posso aguardar a positivação desse anticorpo em casa. Estava bem. A dor torácica havia passado. Meu pulmão estava 100%. Era hora de enfrentar todos os desafios, pois o Hospital estava lotando e mais e mais pacientes internavam com gravidade importante.
Muitas melhorias no serviço, aparelhos de laboratório novos, capsulas de Hood, gasometria, BIPAPs, protocolos de tratamento de ponta, alinhamento fantástico com a equipe médica, fisioterapia, enfermagem, nutrição, psicologia, administração. O Hospital em harmonia, numa batalha ferrenha para restaurar a saúde de doentes com 30, 50, 70, até 90% do pulmão comprometido. Que orgulho de poder fazer parte de tudo isso. Não tinha tempo para almoçar, dormir tranquilo já era exceção, muitas intubações, passagens de cateteres, pronação de paciente obeso… tudo com muito amor e dedicação.
Eis que dia 23 de maio, sábado, começei a me sentir muito fadigado, não conseguia sair da cama.
Mas obviamente não tinha escolha. Fui trabalhar. Sábado à noite, febre e calafrios. Coriza. No domingo, passei o dia mais difícil durante todo o enfrentamento. Uma série de problemas críticos a serem resolvidos. E um paciente de quase 200 kg para cuidar, estabilizar, para conseguir dar condições de voar até Manaus de Salvo Aéreo. Foi um sucesso. O paciente de 36 anos, que chegou saturando 46%; após intubação foi a 67%. E, após a pronação (colocar o paciente intubado de barriga pra baixo, um sufoco), a saturação foi subindo, e na hora do resgate aéreo, entregamos o paciente com saturação de 96%. Sai acabado do hospital, mas feliz.
Mais uma noite com febre. E, no outro dia, muita dor no peito. Nesse momento, um filme passou pela minha cabeça.
Eu, que havia me isolado de minha familia por 52 dias para protegê -la, poderia estar novamente com COVID? E, ainda fatalmente, a teria contaminado.
Fui realizar exames. Meu IgG teimou em não se mostrar positivo. O IgM mais forte do que nunca. E meu hemograma com leucócitos e plaquetas baixas. Seria uma outra infecção viral? Segunda à noite, mais um paciente grave para intubar. Só eu sei como estava lá, era mais alma do que físico para suportar.
Terça fui para tomografia. E para o meu desespero, lesões agudas compatíveis com COVID, em torno de 15%. Nesse momento não fui forte. Entrei no carro, e desabei. Chorei feito criança. De medo de ficar grave. De raiva, por ter tido tanto cuidado com minha familia e expô la ao vírus. Revolta, por ter que me afastar novamente da direção do hospital, e, principalmente, de ter que sair da linha de frente.
De médico à paciente pela segunda vez.
Conversei com alguns colegas em São Paulo, e me aconselharam a ir para minha cidade natal, para uma investigação mais minuciosa. Não é comum uma reativação como essa. E como fator de complicação, o excesso da minha exposição a altas cargas virais durante procedimentos com pacientes c COVID grave. Refleti. Pensei que se a minha esposa também adoecesse, não teríamos na cidade quem cuidasse de nossa filha. Decidimos dar um jeito de vir para São Paulo.
Me dirigi ao Hospital do Coração, onde fui atendido pela equipe da dra Lotaif, médica conhecida de nossa família. Realizei uma série de exames e, em nova tomografia, o acometimento das lesões no pulmão tinham avançado. Estando em torno de 30%. O exame RT PCR , que pesquisa diretamente o vírus na garganta e nariz deu fortemente POSITIVO. A equipe da infectologia optou então por me internar.
Para invesrigar a fundo o que esta acontecendo e, principalmente, para tentar brecar essa avanço rápido da doença em meus pulmões.
Ainda sinto muito desconforto no tórax, e hoje ainda tenho alguns exames e muitas medicações para tomar.
Eu agradeço todas as manifestações de carinho e apoio.
Saibam que confio muito no trabalho da minha equipe de enfrentamento. Estamos realmente fazendo um trabalho de excelência.
Estou recebendo aqui no H Cor exatamente o mesmo tratamento que fazemos aos nossos pacientes. E ainda temos a grande vantagem de uma equipe de fisioterapia que faz as ventilações não invasivas nas cápsulas de Hood, de maneira fantástica. Sempre protegidos, tanto que nenhum membro da fisioterapia se contaminou.
Deixo aqui meu relato, meu agradecimento ao prefeito Bi Garcia, incansável na luta e no apoio de sua equipe médica, e toda a equipe da SEMSA e dos Hospitais Jofre Cohen e Padre Colombo.
E um agradecimento especial à minha esposa por sempre estar ao meu lado. Em breve retornarei à batalha. Agora chegou a hora de me cuidar. Espero que meu próximo post seja sobre minha alta. Assim será!"
1.° caso no Brasil: médico da linha de frente recebe diagnóstico de reinfecção do coronavírus. Publicado em 30/05/2020 e acessado em 02/06/2020.

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

453 - Pneumomediastino


Resumo
"Relatamos cinco casos de pneumomediastino primário espontâneo. Quatro eram pacientes do sexo masculino e um, do sexo feminino, com a idade média de 17 (14-25) anos. Quatro apresentaram pneumomediastino devido a esforços praticados em esportes e um teve esta condição clínica relacionada com o karaokê.
O pneumomediastino (presença de ar no espaço entre os pulmões) primário espontâneo é uma patologia pouco frequente, e não há descrição anterior de caso relacionado ao karaokê.
Todos os pacientes referiram dor no peito e/ou dor de garganta antes do atendimento no hospital. Radiografias de tórax e tomografias computadorizadas de tórax mostraram o pneumomediastino - sem lesão esofágica ou traqueal. Quatro pacientes não necessitaram de hospitalização, e apenas um foi necessário internar por 7 dias por causa de intensa dor no peito e no pescoço.
Acompanhados durante mais de 1 ano, nenhum dos pacientes apresentou recidiva do pneumomediastino. É importante diferenciar esta entidade de outras doenças que apresentam dor torácica."
Fonte
K. Togashi, Y. Hosaka Primary - "Primary Spontaneum Pneumomediastinum", Kyobu Geka, vol. 60, no.3, 2007, p. 1163-6.
Comentário
Em minha vida profissional já acompanhei alguns pacientes com esta patologia. Recordo-me de um paciente que teve o pneumomediastino espontâneo causado por crise asmática e de outro em que essa patologia ocorreu por ter feito uma manobra de Valsalva durante a inalação de uma droga ilícita. Ambos se recuperaram plenamente. PG