por Ana Margarida Furtado Arruda Rosemberg,
médica pneumologista e historiadora
A tuberculose povoou o imaginário social nos séculos XIX e XX. Por ser doença crônica, de evolução arrastada, cheia de episódios dramáticos de hemoptise e sombras de morte, inspirou a criatividade humana, sendo força criadora de obras consagradas na literatura, artes plásticas, música, teatro e cinema. A tuberculose foi integrada ao romantismo por ter ferido prostitutas, escritores, pintores, músicos, literatos e poetas das altas classes sociais. Byron, Musset, Henry Murger e Alexandre Dumas Filho exerceram influência no romantismo francês da tuberculose. Murger, escritor tuberculoso, apaixonou-se por Cristina Roux (Mimi), tuberculosa, e fez dela a personagem de seu livro “Cenas da vida boêmia”. Puccine o transformou na famosa ópera “La Bohème”. Alexandre Dumas Filho escreveu o celebérrimo livro “A Dama das Camélias” para contar a história da prostituta Alphonsine Duplessis, que morreu tuberculosa aos 23 anos. Verdi aproveitou o tema para a famosa ópera “La traviata”. A tísica, como era conhecida a tuberculose, reinou soberana nos hagiológios, nos palcos, entre os músicos, nos ateliês de pintura e escultura, nos laboratórios, nos tronos, entre os reformadores religiosos e no meio político. Entre os letrados a colheita foi farta e quase todos os poetas tísicos sofreram as agruras das febres vespertinas, suores noturnos, consunção, hemoptises, tosse e morte prematura. Na poesia lírica a febre foi cantada, a tosse versejada, a inapetência e o emagrecimento exaltados e a hemoptise poetizada. A tuberculose impregnou toda a poética no Brasil até o final de 1950. Passa de 40 o número dos poetas que acalentaram em seus pulmões o bacilo de Koch. Noel Rosa, Castro Alves, Álvares de Azevedo, Manuel Bandeira, Casimiro de Abreu, Augusto dos Anjos foram consumidos pelo bacilo. Na literatura de ficção temos: “A Montanha Mágica”, de Thomas Mann, “Florada na Serra” de Dinah Silveira de Queiroz. Nas artes plásticas a tuberculose foi uma das doenças mais retratadas. Cristóbal Rojas (1858-1890), que morreu tuberculoso, pintou personagens lúgubres, melancólicos e tísicos. A tuberculose moldou a maneira de Edvard Munch (1863-1944) ver o mundo e influenciou sua arte. Sua irmã Sophie morreu tuberculosa, em 1877, com apenas 15 anos. Sua mãe foi vítima do bacilo, quando ele tinha 5 anos. Suas obras: "A Criança Doente", "Melancolia" e "O Leito da Morte" retratam a tuberculose. A tela "O Grito", evidencia toda a sua angustia diante de uma vida marcada pela doença. Fidélio Ponce de León (1895-1949) morreu tísico. Sua obra, "Tuberculose", reflete sua experiência de sofrimento diante da devastadora enfermidade. Alice Neel (1900-1984), ícone do feminismo, que se destacou por suas obras expressionistas de grande intensidade psicológica e emocional, foi tuberculosa. Sua pintura, "TB Harlem", retrata Carlos Negrom, um jovem com fácies típicas de um tísico crônico. Em “Alegoria à Primavera” de Botticelli, a tuberculose está retratada, pois Simoneta Vesputti, a modelo do artista, morreu tuberculosa aos 23 anos. Segundo Rosemberg, a primavera da erradicação da tuberculose um dia chegará, pois a humanidade já enfrentou e venceu outros terríveis invernos.médica pneumologista e historiadora
Publicado in:
Revista Jornal do Médico, Ano VIII / Edição nº48, Janeiro/Fevereiro, 2013
Blog MEMÓRIAS, 24 de março de 2013
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